segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Crente


(Foto Ben Goossens)


a fé me prostrou
diante de uma sucessão
de pequenos fracassos
entre tantos delírios e planos

o tempo tratou
de aniquilar a saliva

(numa boca tão árida
que beijos iriam nascer?)

contra a lógica da perda
insana a crença afronta
nenhum instinto 
parido faminto da carne, do corpo
foi sentido em vão

eu cri

embora nem mesmo soubesse
para sempre te quis muito bem

aquele amor aos pedaços
rescaldos de tantas vontades alheias ou tuas
não foi uma ilusão infundada

é o amor 
para sempre

e disso eu já sabia
embora nem mesmo soubesse

sabia,
não sei como,
sabia...

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Reggae



salgado é o caminho
doce é a sensação

o Cristo ungido
ostenta atitude
espalhando
seus dreadlocks
pelo ar

a paz já não é branca

a paz é negra,
rubra, amarela,
verde

multicolor

passa assim
de mão em mão
boca-a-boca
num beijo
comungado

cosmopolita


Malu Sant'Anna

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Pelos olhos de Larissa

pelos olhos de Larissa
iça maldita sina
essa de dedilhar os vãos
por onde transcorrem amores

serão vorazes todos
alguns impróprios, talvez inglórios

a dizer nas horas mais concretas
que a maior distância ainda é perto

dentro

no meio do rasgo
na carne
mulher



Malu Sant'Anna

segunda-feira, 25 de abril de 2011

café da manhã

hoje acordei com gosto de domingo


daqueles grandes e doces


que se desprendem do caroço


quando são mordidos




fechei os olhos para ver



duas fatias de papaia


sorriam caudalosas


ao alcande de minhas maçãs




e o dia alaranjado


verteu suores na pequena taça




por aqui tudo é luta ainda


embora sumo seja sempre


muito mais




Malu Sant'Anna

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Completação





uma desenha mundos
a outra os recorta

com um pé
embalo o sonho
enquanto o outro
procura
porta

vivo o intenso
daquilo
que mais preciso

tudo quanto cabe

na imensidão
do teu sorriso

Malu Sant'Anna

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Nova


(Foto Daniel Coelho)


Janelas viciadas
essas pelas quais
as paisagens passam
sempre iguais

o caminho é longo
quando já se perdeu
a graça contida
nas maiores pequenezas

e a vida é sempre a mesma

meus pés, entretanto,
dizem-me a mais
daquilo que os olhos gritam

quando chutam o balde
e enveredam contra-mão

outra, adiante
expectadora e cria

vendo dentro
renitente

brotar a mutação

Malu Sant'Anna

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Batismal


(Foto Ben Goossens)

Um sussurro numa avenida vaga
passsos lentos, contrasensos
tudo agora é pouco
e muito me parece nada

sonho estrelado
em mar aberto

de estar mais perto
do alívio salgado

madrugar o vento
compor o ato inusitado
de conceber o dia

sem liturgias
simplesmente nua

meu avesso
marulhado


Malu Sant'Anna

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Pupa


(Foto Graça Loureiro)

Tudo é vontade
que me move
mundo à fora

armazenados folguedos
contrastam
com as emboloradas
falências próprias

comungo caos
em coquetel
de lucidez

já que tenho andado
sempre tão dentro

casulo

descabida

minhas asas
se avizinham...


Malu Sant'Anna

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Ainda que o dia amanheça...

(Foto Ben Goossens)

Ando pelas tabelas, de pé embaixo, lomba acima
renegando o legado imposto por desistência
de uma causa supostamente superior

e onde estive, enquanto me moldavam
mãos contrárias à sublimação do ser?

Reclusa, por certo, em algum atalho
petrechado nos entraves dos descaminhos

encravada numa dessas rupturas tão típicas
do desapego etático, profuso
no seu estado mais etílico

agora, canta prá subir! Entidade

preciso misturar a planta dos meus pés
aos arrebóis do novo dia

já que a madrugada desandou
num sufoco morno, meio rouco

cuspido e escarrado
qual pedaço de mim


Malu Sant'Anna

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Estradeiro



vem com calma
atento aos riscos
do mundo cão

eu espero

sonhando ser
estrada

Malu Sant'Anna

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Cadeira velha

(Imagem Google search)


parte da mobília
peça antiga
valor sentimental

não se oferecia
às visitas

não resistiria aos quadris
das gordas tias
e aos pulos dos pequenos
irrequietos filhos
sobrinhos e netos

pensaram mandá-la
junto ao entulho
recolhido em mais
uma reforma

faltou-lhes coragem...

coberta de pó,
casinha de cupins
ainda guardava
a nobreza de ser
testemunha silenciosa

nada pedia
além do canto
sombrio, esquecido
ao lado da porta
do quartinho dos fundos

de onde percebia
tanta vida a passar

Malu Sant'Anna

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Incolores traços meus

(Foto Google search)


o céu feito tela
o mar feito chão

traço sem tinta

no vazio etéreo
navega à deriva

sonhando ser ilha

meu coração

Malu Sant'Anna

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

quereres teus

(FOTO ALBERTO PEREIRA DE MIRANDA)


jangada
se queres chegar
na margem oposta

e asas,
para quando
tu queres
voar

copa frondosa
à sombra da qual
alivias os teus
descaminhos

e rosa
para perfurmar
e colorir teus
contundentes
espinhos

água salgada
que lava a alma
e a leva

espada
que quebra
grilhões e liberta

estrada
a porta aberta
a boca na taça
de vinho

sou vento
que sopra sentidos
te afaga os cabelos

à espera de ti

teu ninho.

Malu Sant'Anna

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Em flor



Semeei ventos e tempestades
nas trincheiras quotidianas

belicosa essência ancestral
nos campos da sobrevivência

até que fui rendida
na origem uterina
que em mim, corpo lúteo
falou mais e melhor

pintou meu avesso
rubro vibrante
com as cores petaladas
de canteiros fartos
e férteis

e o mundo acordou
muito mais cor

de rosa.

Malu Sant'Anna

Semeadura

(Foto Ben Goossens)


Comungam
a vala e o grão

vão faminto
de vida

procriação.

o broto rebenta
a aridez e desterra

inércia latente

que dele, à terra
outrora semente

é vértice
rompendo

entranhas
do chão

Malu Sant’Anna

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Mea culpa

(Foto Google search)


Hoje não quero portas abertas
ou olhos que vertem nas frestas

abdico do perdão que por covardia
ou extrema vaidade pensei pedir
quando a dor de ser má
atou nós e me inundou de breu

dou ao tempo passagem célere
para que amadureçam verdades
subscritas em intensas emoções
sempre incontidas no calor da hora

tanto ainda que se desvendar
eu temo, pelo gume de minha língua

nem um passo, través ou avante
apenas nada, agora... vazio que aperta

e uma expectativa muda
para que o caos em si definhe
sendo apenas mais uma página virada
uma esquina a mais dobrada
na senda comum de nós dois.



Malu Sant'Anna

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Trampolim

(Foto A. Brito)

Em cima da casa
os braços abertos
são asas

O salto,
pra onde?

Não sei...

É como um tiro
no escuro,
a cara de frente
para o mundo

quando o que
eu mais queria

era me esconder!

Malu Sant’Anna

terça-feira, 7 de abril de 2009

Foto tradução (Para Tahys Meybom)

(Foto Google Search)

Eu te sabia assim,
te sentia além dos
limites das cidades
da região metropolitana
de Porto Alegre.

Com mesuras
dispensáveis
desde que aprendi
a decifrar
os meus eleitos

parei no teu olhar
cansado e despretensioso
e no rascunho traçado
logo abaixo: um quase sorriso.

Ali, naquele instante,
eu te conheci
novamente.

Malu Sant’Anna


segunda-feira, 23 de março de 2009

Jardineiro

FOTO LIV EDGEWORTH
Ao poço fundo
que continha
e vertia
tanta mágoa
minha

bastou
poucas pás
da tua terra fértil

para florescer
no lugar
o jardim
dos meus sorrisos.

Malu Sant’Anna

quinta-feira, 19 de março de 2009

Esquecimento

FOTO FREDERICO ABRANCHES DE R. VIOTTI

Eu te procurei em muitos lugares.
Estive na velha ponte de ferro, que já não leva a nenhum lugarejo e sob a qual não corre mais o rio. Mudou o curso ou secou... não sei. Só sei que não te encontrei.
Fui até o jardim da velha casa de pedra. O forte cheiro de humo denunciava anos de abandono. Sentei na borda da fonte que no meio, tinha um querubim segurando um jarro, de onde não mais vertia nada. Olhei ao redor, procurando nas sombras tua silhueta... Não estavas lá!
Resolvi entrar na casa. Estava vazia. As madeiras que sustentavam o telhado apodreceram com o tempo e as paredes de pedra estavam esverdeadas com o limo. A única presença inegável nesses caminhos era a umidade. E mais uma vez não te encontrei...
Eu te perdi em algum lugar e já não me lembro onde...

Malu Sant’Anna

quinta-feira, 5 de março de 2009

Dilatação

FOTO ANDRZEJ RADKA


Sinto falta
de mim
em ti.

Aumentaram
teus espaços
ou fui eu
que fiquei
menor?

Malu Sant'Anna


quarta-feira, 4 de março de 2009

Meu grito

FOTO TIAGO REBELO DE CARVALHO

Minha boca cala

para não ferir

no mesmo instante

que minha alma

grita de dor.


Malu Sant'Anna

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

A mulher que falava com os pássaros


(Imagem: Margarida Cêpeda)

Havia naquela pequena cidade de pouco mais de seis mil habitantes, uma mulher que falava com os pássaros. Falava e ouvia. Eles lhe visitavam diariamente e contavam em seus cantos de suas viagens pelo mundo, dos lugares maravilhosos que conheciam. Contavam das matas, dos rios, dos montes e também da crueldade humana, da poluição, da caça ilegal, da ganância.
Ela ficava por horas na varanda de sua casa conversando com os únicos amigos que possuía na vida.
Na cidade, era chamada de louca. Apontavam-na com deboche ou com pavor. Era motivo de piadas e, para os menores, era apontada como perigosa.
Certo dia, alguns rapazes caçaram uns dos amiguinhos da mulher e os jogaram em sua varanda, mutilados e mortos.
Ela ficou terrivelmente ferida em sua alma e então, teve a idéia de avisar o maior número possível de pássaros para que não mais voltassem àquela cidade, sequer a sua varanda. E assim foi por dias, ela avisando seus amiguinhos, que avisaram outros até que nenhum pássaro mais ousou cruzar o céu daquela cidadezinha de pessoas tão cruéis.
Algum tempo depois, ela foi encontrada sem vida, sentada na varanda.
Apesar de dizerem que havia morrido pela loucura ou pela solidão, ninguém que a viu morta jamais esqueceu o ar de serenidade de seu rosto e a candura de seus olhos voltados para o céu.


Malu Sant'Anna

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Corda bamba

FOTO GOOGLE SEARCH

Ínfimo é o espaço
de um pé ante o outro,
cambaleante sobre
o fio da dúvida.

Não consigo andar
nessa retidão fatídica
sem me arremessar
aos barrancos do flanco.

É de outro que preciso,
o caminho ao lado,
o não escolhido.

Porque na minha boca
fica sempre o gosto
do pedaço que não provei.


Malu Sant'Anna

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Alforria

FOTO JOSÉ FERREIRA

Aos poucos solto os nós,
desatando amarras antigas,
vícios recorrentes...

Desvendo meus olhos
e posso também
olhar para dentro.

Chega de caos
e cáusticos louvores
à egolatria.

Pensamentos
impostos,
tempo de chibata em punho.

Tudo que agora sei
é também do que preciso:

o mar que me espera
perpétuo
para enfim me libertar,
mansa e sem juízo.
Malu Sant'Anna

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Frutífera

FOTO LUCIENE HENRIQUE DOS SANTOS
Nasci árvore.
Tornei-me gente
quando fui atingida
por um raio
durante uma tempestade
subtropical.
Ainda tenho casca,
galhos, flores, folhas.
Tenho seiva e raízes
profundas.
Abrigo seres
e os alimento.
Sim, sou frutífera.
Malu Sant'Anna

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Palavra, senhora de mim!

A palavra em mim
tem energia própria.
Ela manipula
a idéia e faz com que
eu faça exatamente
aquilo que ela quer.
Tem forma e vontade.
Força e propósito.
Materializa e cabe
inteira naquilo que sinto.
Eu sinto a palavra...
Ela brota num pé de pensamento
que irriga minha cerne
e floresce sentimento.
Malu Sant'Anna

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Tatuagem

As Meninas são borboletas e flores tatuadas em minha alma.
Malu Sant'Anna

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Eclipse

A noite foi dormir sorrindo
e o dia pegou carona...
Euforia que se propaga incólume
quando em mim imprimes
o teu e o meu gozo
na carne e no cerne.
Malu Sant'Anna

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Às Borboletas

FOTO GEOMETRIA DE OLHARES - RAFAELA DA SILVA
Meus pensamentos
já foram ígneos,
magma densa
e incandescente
por conta de
uns vícios meus
e outros alheios.

Mas não são mais.

Hoje são flores,
enormes, cheirosas,
férteis, coloridas.

E o melhor de tudo,
atraem as borboletas
mais lindas.


Malu Sant'Anna


Às Meninas

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Sublimar

Diante do mar
sob a luz da lua
teu corpo no meu
minha alma na tua...
Malu Sant'Anna

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Luzes de Natal

FOTO GILBERTO JUNIOR
Pisca-piscam sonhos
nas meninas dos olhos
de meninos e meninas.

É Natal.

Malu Sant'Anna

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Dilacerado

Meu pranto se esvai,
viscoso, escarlate,
vertendo convulsivo
pelo rasgo da dor.

Malu Sant'Anna

No trem

FOTO ANA ALEXANDRINO
É incrível como faces inéditas a minha retina
possam sempre trazer traços tão familiares.


Malu Sant'Anna

sábado, 15 de novembro de 2008

Voo Livre

FOTO HELDER AFONSO
Foi em queda, quando perdi o chão,
que aprendi a voar.
Malu Sant'Anna

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Martha Lúcia, Detetive Particular

É incrível como, às vezes, sei das coisas antes que aconteçam. Surge uma idéia, uma palavra, um aroma, uma imagem, sempre numa fração de segundos, mas com intensidade suficiente para ser facilmente lembrada quando o fato realmente acontece e chega ao meu conhecimento.
Desde pequena é assim. Os amigos costumam brincar que tenho “radares” ou “bola de cristal”. Nunca supervalorizei esta capacidade, apenas acho curioso o fato. Observei que se intensifica nos períodos pré-menstruais. A origem eu desconheço, porém, desconfio que esta “habilidade” ou “capacidade premonitória” tenha a ver com um fato ocorrido na minha infância, que só é sabido por pessoas muito próximas, como as de minha família.
Morávamos na Capital e eu costumava passar as férias de verão na casa de meus avós, que ficava no interior, em zona rural.
Eram férias memoráveis, com direito a banhos de sanga e no canal, empinar pipa (não usávamos cerol!) na estrada de chão batido, que vez por outra era cruzada por uma boiada. Fazíamos esculturas do barro das poças, após a chuva; corridas de aro e comíamos muita jabuticaba nas terras do Amarante.
Naquele dia, fui com meu avô atrás do monte de cascas de arroz do engenho, num pequeno córrego, porque ali crescia um gravatá que se usava para fazer xaropes. Era ideal colhe-lo antes do raiar do sol. O dia ainda ressonava, antes do amanhecer.
Meu avô sugeriu que fôssemos um pouco mais longe, entrando mato adentro e posteriormente parando numa imensa clareira à beira do rio, onde costumávamos acampar. Ainda era início de temporada e não havia campistas. Eu ria muito das piadas que meu avô contava. Minhas gargalhadas retumbavam. De repente ouvimos um zunido muito forte, como se mil cigarras resolvessem vibrar suas asas ao mesmo tempo.
Olhei assustada para meu avô que fez uma cara de quem sabia tanto quanto eu do que se tratava.
Paramos para tentar entender o que estava acontecendo e fomos abruptamente atingidos por uma luz muito forte, de uma tonalidade meio azulada. Ficamos paralisados de medo e, inexplicavelmente começamos a flutuar.
Arrisquei olhar para cima, temendo o que poderia ver... Lá estava uma placa metálica de uma composição que eu desconhecia, pairando sobre nossas cabeças.
Enquanto subíamos, pude perceber que a luz que nos conduzia era quase sólida. Era densa e envolvente, extremamente confortável.
Quando parecia que bateríamos nossas cabeças na placa metálica, perdemos os sentidos.
Acordei em um ambiente exageradamente iluminado e vi que estávamos dentro de cápsulas que pareciam ser de acrílico ou algo parecido, envolvidos em uma substância gelatinosa, também relaxante, mas que nos impossibilitava os movimentos.
Naquele ambiente havia centenas de outras cápsulas, algumas ocupadas por homens, mulheres, crianças, notoriamente vindos de etnias variadas e ainda outras cápsulas vazias.
O tempo que realmente ficamos neste local é impossível precisar.
A consciência recobrada no interior deste ambiente, que permitiu memorizar o local, durou pouco tempo. Novamente o zunido das “mil cigarras” e perdi os sentidos outra vez.
Quando acordei, estávamos no monte de cascas. O sol estava a pino. Meu avô continuava desacordado, com um sorriso sereno nos lábios. Toquei-lhe o ombro e ele acordou. Olhou para mim e sorriu.
Perguntei se sabia o que tinha acontecido e meu avô respondeu que deveríamos ter pegado no sono. Perguntei se ele não lembrava do zunido, da luz, da placa, do ambiente, das cápsulas e ele: nada! Não lembrava de nada disso.
Em sua mão, uma touceira do gravatá que viemos buscar.
De volta em casa, contei para minha avó. Disse-me que não me preocupasse, que se eu estava me sentindo bem, deveria mesmo ter sido um sonho. Eu me sentia incrivelmente bem...
Tempos depois, soube que muitas pessoas, em lugares distintos, haviam passado por experiência similar. Porém, nunca houve uma explicação ou uma prova de que isso realmente aconteceu. Apenas uma lembrança, como de um sonho.
O fato é que, depois disso, quando retornei daquelas férias, os “lampejos premonitórios” começaram a acontecer.
Jamais me incomodaram, pelo contrário. Facilitam muito meu trabalho.
Sou Martha Lúcia, Detetive Particular.


A fuga de Amanda

Havia 2 meses, mais ou menos, que eu não tinha nenhum ”lampejo premonitório”. Depois das férias de 1977, quando essas “premonições” começaram, este foi o maior tempo que fiquei sem ver ou sentir algo que depois viria acontecer.
De certa forma, eu estava aliviada. As imagens, sons, cheiros, gostos e fatos que surgiam em minha mente, como uma idéia rápida, ainda que não me incomodassem muito, faziam com que me sentisse incomum. Agora eu estava há cerca de 60 dias me sentindo uma mulher comum, normal.
Eu estava prestando serviços para uma empresa de auditoria. Era ano eleitoral e o carro chefe da maioria das campanhas era a transparência. Os auditores não davam conta do trabalho e, por isso, buscavam apoio nos escritórios de investigação, como o meu.
Eu fazia o levantamento dos gastos, verificando a autenticidade de notas e recibos, número de cabos eleitorais e suas áreas de atuação, enfim, buscava atestar a transparência que era o objetivo maior de todos os candidatos naquele pleito.
Era um trabalho desgastante. Eu queria evitar o contato com os demagogos profissionais, mas era impossível. O ganho financeiro falava mais alto. Pagavam bem e pagavam adiantado.
Havia feito uma contagem pública dos cabos eleitorais de um candidato à Prefeitura em pleno Mercado Público. Uma algazarra generalizada...
Quando cheguei em casa, já eram mais de dez horas da noite. Os meninos estavam em seus quartos, jogando vídeo game, assistindo os clips da MTV. Meu marido estava viajando. Beijei os meninos, perguntei da escola, se já tinham jantado e fui tomar meu banho.
Um banho quente, demorado, relaxante... Tudo o que eu precisava.
Fui para o quarto enrolada no roupão. Arrumei a cama. Tirei o roupão e deitei nua, como costumava fazer. Em poucos minutos adormeci.
Acordei na manhã seguinte e, no primeiro piscar de olhos daquele dia, um rosto surgiu em meu pensamento.
Era o rosto de um homem, aparentando 30 anos. Moreno, cabelos desgrenhados, levemente grisalhos sobre um preto muito forte. A pele era incrivelmente lisa, sem marcas, de uma tonalidade extremamente saudável. Os cílios longos e as sobrancelhas perfeitamente desenhadas contrastavam com os olhos grandes, o nariz largo e a boca carnuda. Por incrível que possa parecer, essas discrepâncias entre alguns detalhes de sua face e os traços fortes o faziam parecer deslumbrante: sexy, interessante, charmoso...
O rosto permaneceu em meus pensamentos por uma fração de segundos, o suficiente para que eu não esquecesse jamais. Quando a imagem desapareceu, um nome surgiu, como uma bolha de sabão, redondo, colorido, flutuante: Amanda!
Fiquei por alguns minutos pensando no homem e no nome.
Este seria o último dia da campanha e eu tinha muito trabalho. Relatórios para finalizar, notas para conferir, reuniões, entrevistas... Seria um dia interminável e começava justamente com uma mensagem subliminar sobre algo ou alguém que eu sequer imaginava o que poderia ser. Mas já estava acostumada. Na hora certa, tudo seria revelado.

Levantei-me preguiçosa. Os meninos já haviam saído para a escola. Fui ao banheiro. Escovei os dentes. Tomei um banho rápido e fui para o quarto me arrumar. Deveria passar na auditora antes seguir com a maratona de visitar os diretórios dos partidos.
Por conta deste trabalho, eu estava com três telefones celulares, um de cada operadora. Carregava os três sempre na bolsa. Um deles começou a tocar e comecei a tatear o interior da bolsa para localizá-lo. Peguei o primeiro. Não era. Na segunda tentativa, o celular piscava a mensagem de “identidade oculta”. Tudo bem... Muitos candidatos usam essa configuração. Atendi, ainda com a voz preguiçosa. Ao ouvir a voz do outro lado, senti um frio na espinha. Uma sensação muito intrigante. Um misto de emoção e medo. Era uma voz masculina. Ele disse:
- Detetive Martha, por favor.
- É ela – disse eu. – Pode falar...
- Eu gostaria de encontrar-me com a senhora – disse-me.
Perguntei do que se tratava e ele respondeu-me que queria contratar meus serviços, mas que preferia se encontrar comigo pessoalmente. Expliquei que naquele dia seria difícil, que eu já tinha muitos compromissos... Disse-me que tinha muita urgência e pediu-me apenas 15 minutos do meu dia. Caso eu não pudesse assumir o caso, que ele iria buscar outros meios.
Eu iria até o Mercado naquela manhã, dar uma última conferida nas equipes que saíam de lá. Marquei com ele às 10h30min, na banca 13. Ele pediu que eu falasse para o atendente quem eu era, porque ele estaria esperando. Não foi preciso. Na hora certa, ainda na porta da Banca, avistei um rosto familiar. Era o homem que eu havia visto “em pensamento” naquela manhã.
Aproximei-me cautelosa. Parei diante dele e me apresentei. Disse-me que se chamava Oscar e que procurava por uma pessoa. Um delegado conhecido dele havia indicado meus serviços, com referências muito positivas. A pessoa que ele procurava era sua noiva, Amanda.
Sentei junto dele e pedi um suco de abacaxi. Ele tomava um café.
Contou-me que era noivo de Amanda havia quatro anos. Que ela era uma jovem encantadora, Designer de Moda, recentemente contratada para trabalhar com a renomada estilista gaúcha Milka. Que o casamento iria se realizar no ano seguinte. Que os planos estavam a pleno. Amanda parecia feliz. Porém, na semana que antecedeu o seu desaparecimento, parecia às vezes aflita, às vezes distante.
Antes que prosseguisse, perguntei por que ele não havia procurado a Polícia e respondeu-me tudo indicava tratar-se de uma fuga. Ela havia levado algumas roupas e objetos pessoais, ainda que tenha deixado no apartamento da Rua da Praia quase que tudo o que possuía inclusive o notebook. Que a Polícia pouco faria por ele e que ainda poderia coloca-lo em uma situação constrangedora, no caso de abandono.
Ele queria saber por que Amanda tinha feito isso, mas antes precisava encontrá-la.
Disse-me que pagava quanto eu pedisse. Que amava a moça e, ainda que tudo estivesse muito confuso, tinha certeza do amor dela também.
Concordei em pegar o caso. Afinal, quando um cliente diz que paga o que eu pedir, passa a ser imediatamente meu cliente preferencial.
Pedi apenas que me desse dois dias para que eu concluísse um outro trabalho e ficamos acertados. Como estávamos no centro, sugeri que fôssemos ao apartamento da moça, para que eu pudesse ambientar melhor o caso.
O apartamento ficava em um prédio antigo, de arquitetura clássica, bastante requintado. Subimos até o oitavo andar. Apartamento 802. Entramos. Tudo estava organizado. Todas as coisas em seus lugares.
Sobre a mesa de jantar, o notebook. Pedi que ligasse. Com sorte, Amanda não teria o hábito que tenho de sempre excluir o histórico de navegação da internet.
Cliquei no ícone de navegação, abriu a página do Google. Coloquei o cursor sobre a caixa de pesquisa e esperei. Um leve toque para baixo e ali estava: COIMBRA.
Pronto, já tínhamos uma pista.
Por uma fresta na persiana da janela da sala do apartamento de Amanda era possível ver a Casa de Cultura Mário Quintana. Lembrei de Ju, colega da Academia de Polícia. Costumávamos tomar chocolate quente nas tardes de inverno, no Café dos Cataventos, um dos espaços da Casa. Ju tinha 23 anos e era a única adulta virgem que eu conhecia. Era uma rebelde às avessas, contestadora nata e, apesar de sua postura e aparência, estilo hard core, mantinha-se intocada intimamente. Tinha um bloqueio em relação ao sexo que eu jamais entendi, mesmo porque, ela fugia do assunto sempre. Limitou-se a confessar-me sua inexperiência numa das tardes que nos encontramos no Café.

Oscar estava parado, ao meu lado, olhar vago na mesmo direção que eu olhava.
Lembrei que ainda tinha muito que fazer naquele dia e marquei uma visita mais minuciosa no apartamento no dia seguinte. Saímos juntos, devagar. Ele ia me contando sobre como conheceu Amanda, que ela era sozinha como ele. Que era uma jovem encantadora e, nos últimos dois meses, parecia estar ainda mais apaixonada do que nunca.

No tempo que fiquei no apartamento de Amanda, a pesquisa no Google era só o que tinha. Todo o restante do conteúdo do PC, pastas, arquivos, arquivos temporários, parecia ter sido apagado.
Pensei que precisava estabilizar minha aura. O estresse da campanha eleitoral poderia me deixar vulnerável e eu senti que precisava estar forte.
Naquela noite, pesquisei sobre Coimbra e constatei que, naqueles dias, ocorria a Semana da Moda, no Convento Santa Clara. A ligação entre Amanda e o evento ficou clara. No mesmo instante, um lampejo e um nome: Roxane.

Liguei para Oscar e disse-lhe que eu teria de ir até Coimbra. Era certo que Amanda esteve ou estava lá. Na manhã seguinte, acordei, liguei o rádio e o The Police me brindava com sua “Roxane”. Encontrei-me com Oscar no apartamento de Amanda. Combinamos sobre a viagem. Eu iria sozinha. Era melhor assim.

O Convento ficava na Freguesia de Santa Clara, margem esquerda do rio Mondego, na parte média superior do Monte da Esperança, em posição sobranceira ao mosteiro novo de São Francisco. Já na entrada, um banner imenso com uma foto de uma modelo: seria Amanda?
Parecia realmente a amada de Oscar, que eu havia visto em fotos, porém mais requintada, maquiada impecavelmente com as cores da estação, cabelos em três tons, divinamente esvoaçantes... Pedi informações a uma recepcionista que disse tratar-se de Manuela, uma modelo famosa em Coimbra, que era mantenedora de obras filantrópicas. Por 50 euros (cerca de R$ 140,00), disse-me que me contaria mais sobre a celebridade. Achei justo e possuía bem mais que isso para despesas eventuais. Oscar nada pouparia para saber o paradeiro de Amanda.
A recepcionista disse tratar-se de uma moça muito rica, herdeira de uma grande fortuna. Seus pais haviam morrido em uma tragédia aérea e ela e a irmã gêmea que morava no Brasil eram as únicas herdeiras. Era uma moça destemida, já que comandava um império de cosméticos praticamente sozinha. A irmã, uma aventureira nata, não se envolvia nos negócios e raramente aparecia nos eventos promovidos ou custeados pelas empresas da família.
Manuela era um ícone de beleza na Europa. Seu nome era grife de perfumes. Tinha uma vida discreta, já que pouco se falava de seus envolvimentos afetivos. Recentemente havia viajado ao Brasil, para estar com a irmã. Ficou uns dois meses por lá. Havia retornado à Coimbra para a semana da Moda do Convento e, segundo ouvira, retornaria ao Brasil e ficaria mais algumas semanas por lá.
No horário informado pela recepcionista, Amanda chegou ao Convento em um belíssimo Jaguar XF prata. Eu aguardava na recepção e a vi entrar pelo hall, queixo levemente empinado, passos firmes. Seguiu até uma porta imensa. Antes de entrar, eu disse em tom audível:
- Amanda!
Ela se voltou para mim e sorriu levemente. Ficou parada esperando que eu me aproximasse e então me disse que não era Amanda, que era Manuela, sua irmã gêmea. Perguntei pela irmã e Manuela ficou em silêncio, esperando que eu justificasse minha procura. Então, disse-lhe tudo. Que era Martha Lúcia, Detetive Particular, contratada por Oscar para descobrir o paradeiro da noiva.
Manuela ficou mais uns segundos em silêncio e propôs que nos encontrássemos no almoço.

Manuela relatou toda a história de vida das duas irmãs, que cresceram no mundo da moda e que perderam os pais ainda tão jovens. Que para não dilapidar o império herdado, tinha uma dura jornada. Que a irmã, Amanda, sempre foi aventureira e que decidiram de comum acordo que Manuela ficaria à frente dos negócios. Amanda havia viajado para o Brasil há alguns anos atrás. Conheceu Oscar. Apaixonou-se e acabou ficando por lá.
Mantinha contato com a irmã, através de e-mails e, raras vezes, visitavam-se.

Há cerca de dois meses, Amanda pediu que Manuela fosse até o Brasil, pois precisava muito da irmã. Amanda sabia que Manuela precisava urgentemente de férias. Desde a morte dos pais não tivera um dia de descanso. Então, o impensado aconteceu. Manuela sabia do noivado, mas não chegou a conhecer Oscar, não antes de se passar pela irmã. Sim, Amanda pediu que Manuela ficasse em seu lugar, fazendo-se passar por ela, durante poucos dias, para que ela – Amanda – resolvesse algumas questões de sua vida pessoal. Manuela poderia aproveitar e relaxar durante esses dias. A idéia parecia louca, mas tentadora. Acabou aceitando. Em seu lugar, em Coimbra, uma imensa equipe de assessores se encarregaria de tocar os negócios.
Combinaram tudo, detalhes importantes, informações necessárias... E, conforme combinado, Manuela assumiu o lugar da irmã. Conheceu Oscar e não foi difícil, nada difícil, apaixonar-se por ele. Ele parecia não perceber diferença. Mostrava-se profundamente apaixonado.
No terceiro dia em que estava “no lugar” da irmã, Manuela recebeu uma carta assinada por Amanda.
Mostrou-me a carta que trazia na bolsa.

“Minha querida irmã...

Sei que o que te peço é mais que um favor, é um grande sacrifício. Mas não consigo encarar os fatos de frente. Nesses dias que me afastei, estive com Roxane, uma modelo gaúcha por quem me apaixonei perdidamente. Ela, da mesma forma, entregou-se a esse sentimento novo, sem limites, sem barreiras, totalmente liberto. Decidimos que vamos viver juntas, fora do Brasil. Não tenho coragem de contar ao Oscar, então, peço-te que revele tudo e que lhe peça perdão em meu nome.

Com amor, Amanda”

Ao terminar de ler, passei a mão direita demoradamente no rosto, como que tentando me refazer. Disse-lhe que era necessário contar a verdade, que eu teria de fazer isso, porque estava sendo paga para isso. Era meu trabalho!
Pediu-me que aguardasse mais dois dias. Ela retornaria ao Brasil e contaria tudo.
Pensei que seria impossível manter Oscar em estado de espera, mas concordei que tentaria.

Retornei ao Brasil e Oscar me esperava no aeroporto Salgado Filho. Aflito, não se continha. Menti que encontrei Amanda, que ela havia pedido para que ele esperasse seu retorno, quando lhe contaria tudo. Para minha surpresa, ele concordou prontamente. Levou-me até em casa. Preencheu o cheque no carro mesmo e se despediu.

Não o vi mais. Algumas semanas mais tarde, recebi um Cartão Postal assinado por Oscar e Manuela. Era de uma paradisíaca ilha caribenha onde foram passar alguns dias na cabana onde viviam Amanda e Roxane.


Malu Sant'Anna

Poça

FOTO MARISA DUARTE
Sou chuva na terra molhada
que se mistura, que se espalha...

Quanto mais água empoçada
mais eu me sinto sorvida,
mais eu me sinto lavada...


Malu Sant'Anna

Fantasia

FOTO PAULO MANUEL LEITÃO
Aqui e agora
entre o sim e o não
o senão e o talvez...


Cortarei um pano estampado
e farei dele uma capa
para vestir-me de aventura
e poder criar
minhas próprias imagens.


Pois que seja, então
um breve movimento
que seja puro
o som do tecido
tocando no chão
e que seja luz
o corpo nu
liberto de pudores
despido de realidade.


Malu Sant'Anna

Menina dos olhos

FOTO MARIA

Havia uma menina naquela rua, que nunca dissera uma única palavra em toda a sua vida. Contudo, seu olhar dizia tanto que, diante dela, preferíamos nos calar contemplativos...

Malu Sant'Anna

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Cíclica

FOTO MARISA TAVARES

Meus ciclos comportam erupções de sensações intensas nascidas em várias partes de mim. E sem congruência aparente, passo no mundo em formas tantas, em caminhos sinuosos onde experimento do bom do mel e do melhor num instante para, no seguinte, deglutir o fel amargo da traição.
Assim, transmuto constantemente indo de um extremo ao outro, ganhando ou perdendo...
Por onde passo vou deixando minhas marcas, meus sinais pessoais e um pouco de mim.
Posso estar mansa, serena, receptiva aos apelos do querer, da paixão e do amor, sempre que as portas de minh’alma se abrem e minha percepção emerge, plena e absoluta. Mas, logo ali, um passo só adiante, posso ser fera que aniquila impiedosa. Basta um “quê” para isso e eu enfrento o mundo resguardando minha real essência e destilando todo o rancor que dores e perdas me proporcionaram.
Sim, sou cíclica, de uma natureza mutante, de uma capacidade inacreditável de recomeçar...
Carrego ruínas de sonhos melífluos que plantei em lugares errados. Semeei em mentes turvas e em corações vazios... E, ainda assim, penso que haverá um dia, um lugar de fato, onde poderei compartilhar com outros que também vivam seus sentimentos intensamente, em plenitude. Que tenham, assim como tenho, passos ora firmes, decididos; ora errantes e trôpegos. Que se aninhem em braços alheios, sem que para isso sejam enfiados em gaiolas... Porque sou pássaro liberto e dona de mim!
Até então, tenho encontrado em meu caminho figuras instigantes e mesmo estranhas... São composições inúteis, que não ousam sequer desvendar uns poucos mistérios dessa vida.
E, então, nem dão o primeiro passo, ou ficam pelo meio do caminho. Talvez por isso, vezes tantas apesar de triste, eu ainda prefira andar só...
Não mais lamento pelas vezes tantas em que me viraram as costas, esses tolos que pensaram serem importantes eternamente. A importância um dia acabou e em seu lugar deixou apenas o vazio: o inerte estado de não ser mais nada!
Por outro lado, perdidas num passado distante, repousam lembranças de outros raros que um dia, por circunstâncias inesperadas e inexplicáveis acabaram partindo para longe. Mas consigo levaram um pouco do melhor de mim. E os pensamentos compartilhados em momentos de indiscutível verdade, permanecerão preservados para sempre e poderão sempre vir à tona da minha real compreensão.
Jamais esquecerei aqueles que um dia ousaram decifrar os enigmas da essência que emana de uma mulher ainda que por um instante, ainda que em um ciclo apenas.
Para se atrever a ter o mundo nas mãos e depois ter de abrir mão dele é preciso muita coragem...

Sendo assim, e compreendo que tudo tem seu sentido de ser (quando parece não ter, podemos criar), descubro que, por mais que eu olhe ao redor e não veja nada, não veja ninguém, quando olho para dentro, para meu íntimo se metamorfoseando mais uma vez, vejo que a vida está me ensinando outra vez e que quanto mais eu sei mais eu quero saber...
Cíclica sim, e insaciável na arte de viver!


Malu Sant'Anna